04/11/2012

Governo Obama tem avanços sociais e apatia econômica


Presidente democrata assumiu o país em 2009, em meio a crise econômica.
Morte de Osama bin Laden e reforma da saúde foram destaques da gestão.

Juliana CardilliDo G1, em São Paulo
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Barack Obama, primeiro presidente negro dos Estados Unidos, assumiu o comando do país mais rico do mundo no dia 20 de janeiro de 2009 com a promessa de avanços em diferentes setores, criando grande expectativa entre eleitores ávidos por mudanças. Quase quatro anos após o histórico dia da posse, Obama tenta a reeleição nas urnas tendo cumprido parte dos compromissos, mas sem ter tirado do papel muitos dos seus projetos. Confira abaixo um balanço do atual governo americano:
Economia
obama reunião economia 300 (Foto: Andre Winning/AP)Obama em reunião com conselheiros econômicos
na Casa Branca, em 2009 (Foto: Andre Winning/AP)
A crise financeira que freava a economia e preocupava milhões de cidadãos quando Obama assumiu o governo até hoje não foi solucionada. Nos oito anos anteriores ao mandato democrata, os Estados Unidos haviam perdido mais empregos do que nas últimas três décadas. Com Obama, os problemas apenas não se agravaram.
O tempo todo ele ficou tentando tapar buraco, injetando dinheiro na economia [...] não acho que o meio foi interessante"
Samy Dana, da Escola de Economia da FGV
"Obama assumiu com um dos piores legados da história. Eu diria que o governo lidou muito bem com essa situação. Foi a pior crise econômica em várias décadas", diz Oliver Stuenkel, professor do núcleo de estudos sobre Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) de São Paulo.
O problema econômico que os Estados Unidos enfrentam é estrutural, ninguém consegue modernizar um pais inteiro em quatro anos [...] As expectativas foram muito altas"
Oliver Stuenkel, professor da FGV
Para Samy Dana, da Escola de Economia da FGV, após a chegada de Obama a crise não teve piora, mas "não se pode falar que foi um governo excelente". Ele acha que o democrata agiu de maneira bastante intervencionista. "O tempo todo ele ficou tentando tapar buraco, injetando dinheiro na economia. Ele tentou retomar a confiança do empresário americano, foi assertivo, mas não acho que o meio foi interessante. Ele injetou mais do que precisava, o dinheiro começou a ficar ineficiente."
Entretanto, apesar dos esforços, as próprias eleições tornam mais difícil uma melhoria. "A economia engatinha, dá os primeiros passos fora da crise, mas, por conta das eleições, o mercado não está otimista para investimentos futuros. A crise abalou o sonho americano, de que tudo dá certo, que quase tudo é intangível", afirma.
O crescimento da China no cenário mundial também teve impacto na economia americana. "A China cresceu como um parceiro econômico viável para outros países, principalmente em relação às commodities. Há muitos países onde, antes, os Estados Unidos eram o principal parceiro econômico, e a China pegou o lugar americano", diz Erick Langer, da Universidade de Georgetown.
Apesar dos sinais de melhorias – a taxa de desemprego caiu para 7,8% em setembro, a menor desde que Obama foi eleito – o professor Oliver Stuenkel ressalta que nunca um presidente dos Estados Unidos foi reeleito com tantos desempregados no país.
"O problema econômico que os Estados Unidos enfrentam é estrutural, ninguém consegue modernizar um pais inteiro em quatro anos. Agora o governo começou a pagar pelo preço das grandes promessas da campanha. As expectativas foram muito altas", diz Stuenkel.
"Muito disso o presidente assume a responsabilidade, poucos eleitores vão acreditar que é por causa dos anteriores", completa o professor, que classifica a situação econômica atual como "complicadíssima" e prevê uma recuperação plena apenas entre 2015 e 2016.
Política externa
obama bin laden operação (Foto: AP/Casa Branca)Barack Obama e Hillary Clinton, em 2011, durante a
ação que matou Bin Laden  (Foto: AP/Casa Branca)
O legado deixado por George W. Bush nas questões de política externa também foi um grande desafio para o governo Obama. "Os Estados Unidos se encontravam com uma reputação bastante negativa como consequência da presença de tropas no Afeganistão, no Iraque. O grande erro do Bush foi o foco excessivo no Oriente Médio. Obama assumiu em uma situação em que o país procurava ganhar legitimidade internacional", avalia Oliver Stuenkel
Obama dizia que guerra do Iraque não tinha sentido, mas percebeu a necessidade de intervenção. O mesmo acontece no Afeganistão"
James Green, da Universidade de Brown
Segundo analistas, o democrata percebeu, ao assumir o poder, que sair do Iraque e do Afeganistão não era tão simples. "Obama dizia que a guerra do Iraque não tinha sentido, mas percebeu a necessidade de intervenção. O mesmo acontece no Afeganistão", afirma James Green, professor da Universidade de Brown.
Barack Obama tropas continência 300 (Foto: Kevin Lamarque/Reuters)Barack Obama bate continência a tropas em base
no Afeganistão (Foto: Kevin Lamarque/Reuters)
Ter capturado Osama bin Laden, líder da rede terrorista da Al-Qaeda, morto durante ação dos Estados Unidos no Paquistão, foi uma grande vitória para o presidente. Bin Laden comandou os ataques de 11 de setembro de 2001, que resultou na queda das torres gêmeas de Nova York e mudou a dinâmica de relacionamento entre países em todo o mundo e colocou os Estados Unidos em destaque pela luta contra o terrorismo. A morte de Bin Laden gerou elogios ao presidente até de seu antecessor, o republicano George W. Bush.
A crise econômica também influenciou a política externa, com cortes de defesa significativos, com o impacto da crise na Europa e com a ascensão da China como nova parceira comercial de boa parte do mundo.
"O quadro geral da divida pública e da falta de perspectiva de que os Estados Unidos se recuperarão rapidamente impossibilita uma grande presença global americana. Os últimos anos mostraram que há claras limitações", diz Stuenkel. "Mas, por enquanto, não há nenhum outro país que chegue perto da potencia militar que os Estados Unidos são, mesmo com esses cortes orçamentários."
O professor Green ressalta que, em outro momento econômico, a presença dos Estados Unidos no Oriente Médio será muito maior. "Em outro momento, o governo teria uma política muito mais bélica para a região. Mas há agora uma noção de que não há possibilidades infinitas de intervenções".
Com relação ao Oriente Médio, as grandes orientações permanecem: o alinhamento automático com as políticas israelenses, a manutenção de uma rota de colisão com o Irã, a continuidade da chamada guerra contra o terror, ainda mortal, mas levada a cabo de outros modos"
Salem H. Nasser, professor da FGV
Primavera Árabe, com revoluções em diversos países, também teve grande impacto no país. "As revoluções de maneira inevitável ressaltaram as incoerências da postura americana em relação à região. Não foi uma política específica do governo Obama", afirma Stuenkel.
Soldados do exército da Síria patrulham o bairro de Karam al-Jabal (Foto: AFP)Soldados do exército da Síria patrulham o bairro de
Karam al-Jabal, em meio a confrontos (Foto: AFP)
O professor Salem H. Nasser, especialista em direito internacional da FGV, concorda. "Houve uma promessa de mudança, mas ficou apenas no discurso. Essa é uma marca de Obama, muito talentoso no discurso e na promessa de transformação, mas com uma manutenção do status quo", afirma.
"Com relação ao Oriente Médio, as grandes orientações permanecem: o alinhamento automático com as políticas israelenses, a manutenção de uma rota de colisão com o Irã, a continuidade da chamada guerra contra o terror, ainda mortal, mas levada a cabo de outros modos."
Em relação ao Brasil, os especialistas afirmam que, apesar da ascendência do país como um líder na América Latina e como uma nova potência, a região ainda não desperta muita atenção dos Estados Unidos. "A América Latina está abandonada, e o Brasil também, o que de certo ponto de vista não seria tão ruim, no sentido de não expandir a influência norte-americana", afirma o professor Green, especialista em história brasileira.
Apesar dos esforços – pelos quais Obama foi agraciado com o prêmio Nobel da Paz em 2009 – muitas das promessas de campanha não foram cumpridas. "A retirada rápida do Iraque, o fechamento de Guantánamo, isso não foi feito. O resultado desses primeiros quatro anos é uma decepção para muitos, mas não se pode esquecer que o legado recebido foi péssimo, e ele teve que gastar muita energia para restabelecer a legitimidade perdida", diz Stuenkel.
Saúde
Suprema Corte dos Estados Unidos mantém reforma da saúde de Obama (Foto: Globo News)Suprema Corte dos Estados Unidos decide manter
a reforma da saúde de Obama (Foto: Globo News)
Uma das grandes vitórias do governo Obama foi conseguir aprovar no Congresso a reforma da saúde, o "Affordable Care Act", comumente chamado de Obamacare. O plano tem como objetivo expandir o benefício do seguro saúde, principalmente em relação às pessoas afetadas pelo desemprego.
Os Estados Unidos têm índices de saúde ruins em relação a outros países desenvolvidos. E é um dos sistemas mais caros do mundo, apesar de pouco eficiente"
Oliver Stuenkel, professor da FGV
"A questão da saúde é a principal responsável número de falências individuais nos Estados Unidos. Por isso a importância do programa", afirma Marcus Vinícius de Freitas, professor de relações internacionais da Faap. "Ele expande para as pessoas mais velhas, permitindo que elas usem o seguro sem pagar tudo o que seria cobrado, e permite que os jovens fiquem como dependentes do seguro de saúde de seus pais até os 26 anos, idade na qual ele normalmente termina a faculdade."
Há novas taxas de crédito para pequenas empresas que oferecem seguro saúde a seus empregados, novos cálculos para pessoas com gastos de saúde altos, e os jovens já podem permanecer como dependentes do seguro de seus pais por mais tempo"
Amanda Kowalski, da Universidade de Yale
Até a nova regulamentação, os Estados Unidos eram o único país industrializado do hemisfério norte com milhões de cidadãos sem acesso a um sistema de saúde universal. O governo oferecia cobertura a idosos e deficientes, por meio do Medicare, e aos mais pobres, funcionários de governo e veteranos militares, através do Medicaid.
Um total de 15,4% da população dos Estados Unidos – ou 46,3 milhões de pessoas – não tinham seguro saúde em 2008. Com a reforma, a cobertura foi ampliada para 95% dos americanos, oferecendo assistência a mais de 32 milhões de pessoas e controlando os preços cobrados.
Com o Obamacare, as pessoas foram obrigadas a ter um seguro saúde. Quem não possui condições de pagar, recebe ajuda do governo. "Os Estados Unidos têm índices de saúde ruins em relação a outros países desenvolvidos. E é um dos sistemas mais caros do mundo, apesar de pouco eficiente", afirma o professor Stuenkel. "Agora, não é mais possível evitar esse sistema."
A reforma foi aprovada em 2010, passou pelaaprovação da Suprema Corte este ano, mas muitos de seus efeitos só serão implementados em 2014. Alguns deles, entretanto, já entraram em vigor. "Há novas taxas de crédito para pequenas empresas que oferecem seguro saúde a seus empregados, novos cálculos para pessoas com gastos de saúde altos, e os jovens já podem permanecer como dependentes do seguro de seus pais por mais tempo", explica Amanda Kowalski, especialista em políticas de saúde e pesquisadora da Universidade de Yale.
Para ela, os maiores beneficiados pelo programa serão os "jovens, pessoas mais velhas que ainda não são consideradas idosas, pessoas com baixa renda e hispânicos".
Questões sociais
Ele expandiu a possibilidade de as pessoas permanecerem no seguro-desemprego e houve o aumento do uso de tickets de comida, em razão da situação econômica"
Marcus Vinícius de Freitas, professor da Faap
Além da reforma da saúde, que possui impacto sociais profundos, o governo de Obama foi marcado por outras duas conquistas sociais: melhorias na questão do seguro-desemprego, muito utilizado em um período de recessão no país, e o aumento da inclusão dos afrodescendentes.
Obama permitiu o acesso a alguns mecanismos de proteção social para minorar os efeitos do aumento das taxas de desemprego e do crescimento vagaroso da economia. "Ele expandiu a possibilidade de as pessoas permanecerem no seguro-desemprego e houve o aumento do uso de tickets de comida, em razão da situação econômica. Houve também algumas facilidades na questão do crédito", explica o professor Freitas, da Faap. "Foram medidas voltadas a permitir que a população pudesse sobreviver nessa época complicada americana."
Em relação à inclusão das minorias, Freitas aponta que durante o governo Obama houve um aumento no número de afrodescendentes na escola, além de um crescimento do númerto de anos de estudo dessa população. Para ele, isso acontece principalmente devido ao impacto moral de se ter um presidente negro.
"Obama não foi um presidente que enfatizou demasiadamente a questão das minorias, o que poderia dar a interpretação de que ele estava apenas de um lado na questão. Isso é o resultado positivo da ascensão de um afro-americano no poder, e se deveu muito ao impacto moral do presidente, mais do que medidas consideradas somente destinadas a um determinado grupo social."
Educação
Obama defende mudanças na lei de educação dos Estados Unidos (Foto: AP)Obama defende mudanças na lei de educação dos
Estados Unidos; professor vê "avanços" (Foto: AP)
Desde que assumiu, Obama tem tentadopadronizar os níveis da educação nos Estados Unidos, uma tarefa difícil em um país tão descentralizado, onde cada estado possui seus próprios métodos e leis.
Obama manteve o compromisso educacional, em razão até da sua própria historia pessoal. Pode-se dizer que conseguiu fazer mais até do que podia ser esperado quando foi eleito"
Marcus Vinícius de Freitas, professor da Faap
Nesse contexto, o democrata estabeleceu testes padronizados para a verificação do nível educacional dos estudantes do primeiro e segundo graus em matemática e inglês. "Ele estabeleceu uma linha para que os estados tivessem parâmetros comuns em relação ao índice de competitividade que precisavam ter", explica Marcus Vinícius de Freitas.
O objetivo da padronização é melhorar a qualidade das escolas, aumentando as capacidades dos alunos, necessárias para que os estudantes possam entrar na faculdade e no mercado de trabalho. Entretanto, as implementações foram apenas iniciadas. "O reflexo dessas medidas deve ser visto a partir de 2014", diz o professor.
Também em busca de uma padronização, Obama tem fechado escolas que não alcançaram os níveis estabelecidos de qualidade. Os estudantes destas escolas são direcionados para aquelas que possuem os níveis esperados, em uma tentativa de melhorar o ensino oferecido.
A melhoria da qualidade também está sendo buscada na pré-escola, com regras comuns para tentar diminuir a diferença entre as instituições públicas e privadas. "Melhora a qualidade da pré-escola, e como resultado disso, quando a criança segue para a escola comum ela vai melhor qualificada", diz o professor.
No nível do ensino superior, Obama aumentou o acesso ao crédito, assegurando que os primeiros US$ 4 mil pagos na educação universitária sejam gratuitos para a maior parte dos americanos e permitindo que o financiamento da faculdade seja feito diretamente com o governo federal, cortando a intermediação dos bancos e permitindo a cobrança de juros menores.
"Obama trouxe benefícios, particularmente em uma situação em que os EUA têm dois desafios: o declínio da indústria e da capacidade americana e o fato de que em uma economia em recessão é muito mais difícil voltar a investir na educação. Ele manteve o compromisso educacional, em razão até da sua própria historia pessoal. Pode-se dizer que conseguiu fazer mais até do que podia ser esperado quando foi eleito", afirma Freitas.

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