10/11/2012

Lenine e a eloquência de um cancioneiro

Em apresentação no Crato, Lenine fez jus à alegria dos fãs em recebê-lo na Mostra Cariri de Culturas
Algumas vezes, em uma apresentação musical, tanto o artista quanto o público podem surpreender. Foi o que aconteceu na quinta-feira, 8, quando Lenine apresentou show da turnê de seu último disco, "Chão", no Crato, na abertura da 14º Mostra Sesc Cariri de Culturas.

O pernambucano Lenine, na abertura da Mostra Sesc Cariri de Cultura: apresentação baseada no repertório e na estética do álbum "Chão" FOTO: JR. PANELA

Foi a primeira vez que o Ceará recebeu a turnê, com a qual Lenine roda o Brasil desde março deste ano. Além de cidades como Salvador, Recife, Rio de Janeiro e São Paulo, o cantor já levou "Chão" para países como Chile, Argentina, Uruguai, França e Itália.

O álbum, décimo da carreira do pernambucano, foi produzido e tocado por ele, seu filho Bruno Giorgi e o músico e produtor JR Tostoi, com o diferencial de não ter bateria nem percussão. No lugar, entrou o uso intenso de arranjos eletrônicos construídos e misturados com o que o artista chama de "ruídos orgânicos" - capturados a partir de situações cotidianas, como o apito de uma chaleira, da máquina de lavar, o gorjeio do canário de estimação da família e a barulheira das cigarras no bairro da Urca (Rio de Janeiro), onde mora o cantor.

"Chão" é um trabalho delicado e marcante ao mesmo tempo, gostoso de ouvir justamente pela riqueza de nuances. Para fazer jus à qualidade do disco, o próprio Lenine assumiu a direção musical do show, que tem ainda direção de arte de Paulo Pederneiras, do Grupo Corpo. Entre os elementos usados na ambientação, uma espécie de tapete de estopa tingida de vermelho, que ocupa quase todo o piso do palco.

No palco, Lenine é acompanhado de Bruno e Tostoi. Na apresentação do Crato, houve ainda a participação do músico Gabriel Ventura. Os três se revezaram entre guitarra, baixo e duas mesas com laptops e outros equipamentos responsáveis pelos efeitos eletrônicos.

Pontualmente às 22 horas, o show começou no lotado Largo da RFFSA. De cara, Lenine fez uma graça ao emendar o fim e o começo do disco: antes de entrar no palco, entoou um pedaço da letra da última música de "Chão" ("isso é só o começo, isso é só o começo"). Em seguida, já de frente para o microfone, abriu com a primeira canção do CD.

A essa altura, o público já o havia recepcionado com gritos e aplausos. Muitas pessoas sabiam de cor tanto as letras dos hits da carreira do cantor quanto das novas composições.

Como nem tudo é perfeito, porém, sobraram má educação e insensibilidade em vários momentos, com direito a empurrões para chegar mais perto do palco, tietagem excessiva e insuportáveis pedidos repetidos por determinadas faixas (não só nos intervalos entres as canções, mas durante a execução das mesmas).

A despeito desses transtornos, Lenine e a banda mantiveram uma postura inspiradora, entregando-se à apresentação com animação honesta - era visível a satisfação do grupo tanto pela quantidade de pessoas na plateia quanto por estar em uma cidade do interior do Nordeste, região que o cantor considera sua casa.

Além das caras e bocas e da peculiar movimentação de corpo, o cantor interagia com o público constantemente, fosse dirigindo olhares, pedido por palmas ou pela participação da multidão nos vocais.

Foi nessa troca bacana que o show transcorreu por quase duas horas. Os artistas foram generosos e entregaram 20 faixas - entre elas, as dez do disco novo. Além de "Chão", destaque para "Amor é pra quem ama", "Se não for amor eu cegue", "Envergo mas não quebro", "Tudo que me faz falta, nada que me sobra" e "Isso é só o começo", que encerrou a apresentação. As canções alternavam-se entre a delicadeza e o peso, especialmente quando as duas guitarras se faziam presentes.

A elas foram costurados grandes sucessos da carreira do cantor, especialmente dos discos "O dia em que faremos contato", de 1997 ("A ponte", "Candeeiro encantado") e "Na pressão", de 1999 ("A rede", "Relampiano", "Rua da passagem", "Jack soul brasileiro" e "Tubi tupy").

Em momento solo, sem banda, Lenine tocou a delicada "O silêncio das estrelas" (do disco "Falange canibal") e "Do it" (de "Lenine in cité"). Sem esquecer, claro (até pelos gritos do público) da clássica "Leão do Norte" (do álbum "Olho de peixe", de 1994, com o percussionista Marcos Suzano). A adaptação dessas faixas ao formato "eletrônico-sem-percussão" de "Chão" foi muito bem sucedida, sem prejuízos.

A voz de Lenine estava impecável, competente ao se revezar entre timbres delicados e vorazes. Durante o show não houve muito papo além dos tradicionais "Oi" e "obrigado". A explicação veio quando a banda retornou para o bis. "O que eu faço de melhor não é falar abobrinha, é cantar. Assim, ganho tempo e toco mais músicas", brincou o pernambucano. "Mas preciso agradecer o Crato por todo esse carinho", completou.

Lenine destacou ainda a diversidade da Mostra Sesc Cariri das Culturas e seus 14 anos ininterruptos de atividade "Eddie, 5 a seco, Fager. Vai ter muita gente boa tocando aqui", elogiou. Depois da conversa, finalmente atendeu a outro irritante apelo de alguns fãs e entregou o hit "Paciência", seguido de "Hoje eu quero sair só". Perguntado sobre a possibilidade de apresentar a turnê em Fortaleza, embora ainda não tenha uma data, Lenine foi enfático: "logo".

Mais informações;
14º Mostra Sesc Cariri de Culturas

De 8 a 13 de novembro, no Crato, Juazeiro do Norte e outras cidades da região. Todas as atividades são gratuitas. http://www.mostracariri.com.br/ 

ADRIANA MARTINS*
ENVIADA AO CRATO
*A repórter viajou a convite da Mostra Sesc Cariri de Culturas

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